O avanço nas técnicas de transplante de órgãos e tecidos tem ampliado a sobrevida e a qualidade de vida de milhares de pacientes em todo o mundo. Nesse contexto, o cirurgião-dentista desempenha um papel cada vez mais relevante no acompanhamento desses indivíduos, sobretudo pela estreita relação entre saúde bucal e saúde sistêmica. Os cuidados odontológicos no pré e no pós-transplante não são apenas complementares: são essenciais.

O papel da odontologia no pré-transplante
No período que antecede o transplante, a avaliação odontológica tem como objetivo principal eliminar potenciais focos de infecção. Pacientes imunossuprimidos, como os que serão submetidos a transplantes, correm maior risco de desenvolver infecções severas originadas na cavidade oral. Lesões periapicais assintomáticas, bolsas periodontais profundas, cáries extensas e dentes com mobilidade aumentada devem ser tratados ou removidos antes do procedimento.
A literatura é clara quanto à importância desse momento: estudos apontam que intervenções odontológicas no pré-transplante reduzem significativamente a incidência de complicações infecciosas no pós-operatório imediato. Além disso, uma boca saudável contribui para um melhor estado nutricional e para o bem-estar geral do paciente, aspectos importantes para o sucesso do transplante.

Cuidados no pós-operatório: atenção redobrada
Após o transplante, o principal desafio do dentista é lidar com as implicações da imunossupressão prolongada. Medicamentos como ciclosporina, tacrolimo e corticoides, essenciais para prevenir a rejeição do órgão transplantado, aumentam a susceptibilidade a infecções fúngicas, bacterianas e virais na cavidade oral. A gengival hiperplásica induzida por fármacos, a candidíase oral e a xerostomia são alterações comuns.
Nessa fase, a abordagem deve ser preventiva e educativa. Consultas regulares, profilaxia profissional, controle de placa e intervenções precoces são fundamentais. Além disso, é essencial orientar o paciente sobre higiene oral rigorosa e identificar precocemente sinais de complicações. A literatura também destaca a necessidade de protocolos individualizados, adaptados ao tipo de transplante, à medicação em uso e à condição geral do paciente.

O impacto dos cuidados odontológicos
Diversas pesquisas reforçam que cuidados odontológicos sistemáticos em pacientes transplantados estão associados a menores taxas de complicações infecciosas, menor tempo de internação hospitalar e melhor prognóstico geral. Um estudo publicado no Journal of Clinical Periodontology (2020), por exemplo, demonstrou que pacientes transplantados com acompanhamento odontológico regular apresentaram 60% menos episódios de infecção oral nos primeiros seis meses após o procedimento.

A odontologia como aliada do sucesso terapêutico
 É urgente que o cirurgião-dentista seja inserido de forma integrada nas equipes multidisciplinares que acompanham pacientes transplantados. O cuidado com a saúde bucal, tanto no pré quanto no pós-operatório, deve ser compreendido como uma estratégia terapêutica essencial — não apenas para evitar complicações, mas também para promover saúde e qualidade de vida.
Ao assumir esse protagonismo, a odontologia se consolida como uma especialidade não apenas clínica, mas profundamente humana, comprometida com o bem-estar integral do paciente.