Por muitos anos, a odontologia foi moldada por práticas essencialmente manuais. Moldes em alginato, enxertos ósseos convencionais, cirurgias guiadas pela experiência clínica — tudo isso formou a base da nossa atuação. No entanto, estamos diante de uma transformação silenciosa, mas poderosa: a biotecnologia está reescrevendo o futuro da profissão. O que antes era artesanal, hoje pode ser projetado, cultivado e até impresso com precisão celular. Isso nos leva a uma reflexão inevitável: será que a academia odontológica está acompanhando essa mudança?

Atualmente, já temos capacidade técnica para cultivar tecidos ósseos personalizados em laboratório, produzir scaffolds bioativos por impressão 3D e desenvolver biomateriais que respondem a estímulos biológicos específicos. A regeneração guiada de tecidos, que há poucos anos parecia uma fronteira distante, já é realidade em muitos centros de excelência. Ainda assim, percebemos que o ensino odontológico segue fortemente pautado por técnicas tradicionais, muitas vezes tratadas como se fossem o ápice da inovação. Isso nos faz pensar: estamos realmente formando profissionais para o futuro ou apenas perpetuando o passado com roupagem moderna?

Essa distância entre inovação e ensino não é, necessariamente, fruto de desinteresse. Em grande parte, ela está ligada à falta de tempo, de estrutura e, principalmente, de incentivo para atualização docente. Muitos professores ainda veem a biotecnologia como um assunto distante da rotina clínica, restrito a laboratórios ou centros de pesquisa. Mas essa visão precisa mudar. Biotecnologia não é mais futuro: é presente. E, mais do que isso, é uma ponte entre o conhecimento científico e a transformação concreta na vida dos pacientes.

Integrar essas inovações aos currículos não significa abrir mão da sólida base técnica que sustenta nossa profissão. Pelo contrário, significa expandir essa base. Um dentista que domina os fundamentos clínicos e, ao mesmo tempo, compreende os princípios da bioengenharia e da medicina regenerativa, está mais bem preparado para oferecer soluções personalizadas, eficazes e de alto impacto. Imagine um cenário em que o profissional não apenas realiza uma cirurgia regenerativa, mas também participa ativamente do desenvolvimento do tecido implantado, utilizando células autólogas em um ambiente de bioimpressão dentro do próprio consultório. Isso já está acontecendo — e tende a se tornar cada vez mais acessível.

A biotecnologia é um novo capítulo na história da odontologia. E cabe a nós, docentes e pesquisadores, decidir se queremos ser protagonistas dessa mudança ou apenas espectadores. A formação de nossos alunos, a qualidade da nossa ciência e a relevância social da profissão passam, inevitavelmente, por essa decisão. Afinal, o futuro não espera — e ele já começou a ser impresso, camada por camada.