SAÚDEODONTOLOGIA

Formação em Odontologia: um olhar comparativo entre Brasil e Estados Unidos

Letícia Diamantino
Letícia Diamantino30/06/2025
Formação em Odontologia: um olhar comparativo entre Brasil e Estados Unidos

A formação do cirurgião-dentista é a base sobre a qual se constrói a qualidade da odontologia de um país. Embora Brasil e Estados Unidos compartilhem o compromisso com a excelência clínica, as estruturas de ensino, os critérios de ingresso, o tempo de formação e a abordagem pedagógica apresentam diferenças significativas — e compreender esses contrastes pode ser essencial para aprimorarmos nosso próprio modelo educacional.

Acesso e estrutura do curso

No Brasil, a odontologia é cursada como graduação, com duração média de 4 a 5 anos. O ingresso se dá, majoritariamente, por meio do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) ou vestibulares tradicionais, sendo um curso muito concorrido em instituições públicas e privadas. Já nos Estados Unidos, o caminho é mais longo: o estudante precisa, primeiro, concluir um curso universitário de 4 anos (geralmente em áreas como Biologia ou Ciências da Saúde) e, em seguida, candidatar-se à escola de odontologia (Dental School), que dura cerca de 4 anos. Ou seja, o tempo total de formação chega a 8 anos, com alto rigor seletivo.

Essa diferença já aponta para duas abordagens distintas: enquanto no Brasil a formação começa cedo, muitas vezes com estudantes ainda imaturos quanto à escolha profissional, nos EUA o ingresso tardio e mais seletivo tende a resultar em alunos mais preparados e determinados.

Currículo e abordagem pedagógica

O currículo brasileiro tem uma base técnico-científica sólida, com forte ênfase em disciplinas básicas nos dois primeiros anos, e prática clínica supervisionada nos anos seguintes. Em muitas faculdades, há também experiências com atenção básica no SUS, o que contribui para a formação voltada à saúde pública.

Nos EUA, o ensino odontológico é fortemente baseado em evidências científicas, com investimento em tecnologia, simulação laboratorial avançada e uma cultura de avaliação contínua. Há um foco grande em ética, gestão e empreendedorismo, além de uma formação clínica robusta, com menor ênfase na saúde coletiva, devido à estrutura descentralizada do sistema de saúde americano.

Especializações e mercado de trabalho

Enquanto no Brasil muitos cirurgiões-dentistas se especializam após a graduação por meio de cursos lato sensu ou stricto sensu, nos EUA o sistema é mais rígido: as especializações são altamente reguladas, com necessidade de ingresso em programas credenciados, muitas vezes com residência remunerada e exames específicos.

Além disso, o mercado norte-americano valoriza muito a atuação em grupos, clínicas integradas e redes de serviços, enquanto no Brasil ainda há forte cultura do consultório individual — o que impacta diretamente a formação em gestão e trabalho em equipe.

O que podemos aprender com essa comparação?

Ambos os modelos têm méritos e desafios. O Brasil forma dentistas altamente capacitados tecnicamente, muitos com atuação reconhecida internacionalmente. Contudo, há lacunas importantes, como a baixa carga horária dedicada à gestão, inovação e saúde digital, além da necessidade de maior integração entre ensino, pesquisa e serviço.

Já os Estados Unidos demonstram que uma formação mais longa e seletiva pode resultar em profissionais mais preparados para os desafios contemporâneos da odontologia, com maior capacidade crítica e autonomia profissional. Por outro lado, o custo elevado da formação norte-americana limita o acesso e aumenta as desigualdades sociais dentro da profissão.

 

A comparação entre os modelos brasileiro e norte-americano não deve ser usada para eleger um “melhor”, mas para inspirar melhorias mútuas. Em um mundo onde a odontologia evolui rapidamente — com avanços em tecnologia, biossegurança, estética e saúde populacional — é urgente pensar em currículos mais conectados com as demandas atuais e futuras da sociedade.

Mais do que formar técnicos habilidosos, é preciso formar profissionais críticos, inovadores e humanos. E isso começa nas salas de aula.

 

Fontes utilizadas no artigo:

Brasil:
Ministério da Educação (MEC). Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Odontologia. [2019].
Conselho Federal de Odontologia (CFO). Perfil dos Cirurgiões-Dentistas no Brasil. https://website.cfo.org.br

Estados Unidos:
American Dental Association (ADA). “Education and Training Pathways in Dentistry.” https://www.ada.org
American Dental Education Association (ADEA). “Becoming a Dentist.” https://www.adea.org

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